sexta-feira, 16 de setembro de 2016

Assobia-lhe às Botas


Confesso que desconhecia esta expressão que significa dar uma coisa por perdida. Isto é: ser tarde demais para obter o que se deseja.
A imagem não podia ser mais explícita. Um polícia assobia a um infractor (supomos), mas este afasta-se rapidamente e foge. Dito em português popular corrente e de forma sintética: «Já era».
Esta imagem pertencia a uma folha de uma caixa de bolachas provavelmente do final do século XIX ou início do século XX. É rara por diversas razões, mas logo à cabeça refira-se o seu formato circular, destinado a caixas pequenas para oferta, quando o mais frequente eram as caixas grandes quadradas destinadas à venda a granel.
Embora não esteja identificada sei que foi feita para a fábrica de Eduardo Conceição Silva e Irmão, que ficava na Rua de S. Amaro, em Lisboa, pelo que era também conhecida por Fábrica de Santo Amaro ou do Calvário. O local da fábrica era nas antigas cocheiras do Palácio Real do Calvário que o proprietário adquiriu à Casa de Bragança em 1878, juntamente com o seu irmão Francisco.
Em 1901 a fábrica era ainda uma das principais produtoras de trigo, situando-se em 6º lugar. Foi uma firma importante que laborava pelo sistema austro-húngaro, que desconheço o que significava. Tinha depósito em Lisboa na Rua da Prata, 210-212 e na Rua direita de Belém 139-140 e filiais no Porto, na rua Mouzinho da Silveira, 93 a 97, em Viana do Castelo na Praça da Rainha, 36-38 e um depositário em Braga chamado José António da Rocha.
A terceira casa a contar da direita é o Palacete Conceição Silva. Foto do AML.
Foi o seu irmão Francisco quem encomendou ao arquitecto francês Henri Lusseau, a casa, iniciada em 1891, que ainda hoje existe na Avenida da Liberdade em Lisboa de gosto revivalista no chamado estilo neo-árabe e que ficou conhecida como Palacete Conceição Silva.

A produção de bolachas manteve-se ainda após a República como o atestam numerosos litografias feitas para caixas cúbicas e cartazes publicitários de gosto pró-republicano, de que falarei noutra ocasião. A fábrica terá terminado antes de 1918 porque já não consta da lista das principais empresas do sector feita nesse ano. Foi comprada pela Companhia Industrial de Portugal e Colónias que nessa altura havia já adquirido várias outras empresas do sector, incluindo a Fábrica da Rua de Santo Amaro.
Imagem tirada do blog Cinemas do Paraíso
Foi herdeiro da firma Augusto Serra e Costa que o vendeu à Sociedade Promotora de Educação Popular. Esta associação de ensino, fundada em 1904 por republicanos, num outro local, mudou-se em 1911 para o edifício da antiga fábrica onde ainda funciona, partilhando o edifício com a Videoteca da Câmara Municipal de Lisboa. Em 1912 no primeiro andar da Sociedade Promotora de Educação Popular foi instalado o Cinema Promotora, pelo que parece verosímil que a fábrica se tenha extinguido entre 1911 e 1912.

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